Se procuras uma experiência de aventura e natureza verdadeiramente inesquecível, a subida ao Vulcão Acatenango é obrigatória. A Guatemala, com a sua paisagem vulcânica dramática, oferece uma aventura única que combina a subida a um vulcão, uma noite sob as estrelas e a oportunidade de testemunhar uma das forças mais impressionantes da natureza: a erupção do Vulcão de Fogo,o vulcão mais ativo da América Central. Em Abril de 2023 tive a oportunidade de viver esta aventura emocionante com a Soy Tours, e vou partilhar tudo contigo.
A subida ao vulcão Acatenango fez parte de uma viagem de 10 dias pela Guatemala, se quiseres ler mais sobre toda a viagem podes saber mais em Viagem a Solo à Guatemala: O Meu Roteiro de 10 Dias.
Vulcões Acatenango e Fogo
Vulcão Acatenango
O Vulcão Acatenango situa-se na Guatemala, perto de Antigua, a antiga capital do país. É um estratovulcão, ou seja, um tipo de vulcão com forma cónica formado por erupções intermitentes de lava viscosa e materiais piroclásticos (cinzas, pedras vulcânicas,etc). As erupções tendem a ser explosivas e criam montanhas com crateras. No entanto, está atualmente adormecido e por isso é um dos mais icónicos pontos de aventura da Guatemala. O seu cume conta com 3976m.
Vulcão de Fogo
O Vulcão de Fogo ou Volcán de Fuego é também um estratovulcão mas, ao contrário do Vulcão Acatenango, está ativo e é inclusivé o vulcão mais ativo da América Central. Ergue-se numa atitude de 3763m. Está unido ao Acatenango e forma o complexo conhecido como La Horqueta.
Apesar da beleza incrível das explosões e erupções, é relevante partilhar que há incidentes maiores a relatar. Recentemente, em Maio, uma erupção vulcânica levou à evacuação de mais de 1000 pessoas. Em 2018, a última grande erupção registou 194 mortos e cerca de 2000 desaparecidos. No fundo, as erupções não são brincadeira e devemos sempre considerar este risco.
Escolha da Agência, Reserva e Preços
Depois de decidir que queria subir o Acatenango, houve vários critérios que tive em conta antes de reservar a tour com uma agência. Realço que é uma atividade que não deves fazer sem guia, quer pela experiência e dicas que oferecem, quer porque podes precisar de auxílio devido à altitude.
Duração da Tour
Há várias tours disponíveis com diferentes durações, que podes consultar no site da Soy Tours.
- Tour de 1 dia: começa às 4 da manhã e termina às 14h30. Nestas tours chegas ao cume já de dia e as chances de ver lava são muito pequenas. Para além disso, é muito mais exigente fisicamente porque tens de fazer todo o percurso do início ao cume numa única leva.
- Tour de 1 noite: começa às 20h e termina às 12h30. Esta tour é particularmente exigente (e mais do que a acima) uma vez que o objetivo é chegar ao cume pelo nascer do sol, se quiseres ter uma chance de ver lava.
- Tour de 2 dias, 1 noite: começa às 7h30 e termina às 12h30 do dia seguinte. A maioria das avaliações recomenda esta tour por dividir a subida em duas partes (e dois dias) e por ter o melhor dos dois mundos: vista do pôr e do nascer do sol e ainda maiores chances de ver lava. Esta tour também inclui uma atividade adiconal que é a subida ao Vulcão de Fogo, que são 2h30 adicionais de subida (ida e volta). Eu escolhi esta opção.
Rota
Um outro fator a considerar é a rota que queres seguir e, por consequência, em que lado da montanha queres acampar e passar a noite. Há duas rotas possíveis:
- Rota do Nascer do Sol: onde a maioria das agências está, por isso acaba por ser uma paisagem mais lotada e a o Vulcão de Fogo parece mais longe.
- Rota do Pôr do Sol: há apenas duas agências que acampam deste lado: a Soy Tours e Tropicana. Para além disso o sol põe-se deste lado e à medida que isto acontece vamos começando a ver um rio de lava que escorre para o lado do pôr-do-sol, proporcionando melhores vistas a quem fica acampado deste lado.
A maioria das reviews dizia que o lado do pôr-do-sol era melhor e as fotos pareceram mais impressionantes por isso acabei por escolher esta rota.
A escolha da agência
Depois de definir que queria um tour de 2 dias e que gostava de ficar do lado do pôr do sol, foi altura de escolher a agência com quem iria partir nesta aventura. Fiquei então com duas opcões: Soy Tours ou Tropicana.
Ambas as condições eram bastante parecidas: dormida em tendas dentro de uma cabine para extra proteção, refeições bastante boas, empréstimo de roupas quentes a custo zero e aluguer de bastões, pelo que a decisão final baseou-se bastante no preço e nas avaliações online que li.
Soy tours
Preço: 500 GTQ (~60€). Entretanto o preço alterou mas quando fui eram 450 GTQ ~ 55€.
Tropicana
Preço: 79$ (~ 75€)
A minha escolha acabou por ser a Soy Tours.
Abaixo toda a informação que foi partilhada comigo para a minha subida a 13 de Abril de 2023. Realço que entretanto podem ter havido alterações, nomeadamento no preço (confirmado no site).
Depois de escolhida a agência foi só reservar diretamente com eles. Falei com eles no whatsapp, coloquei as questões que tinha e depois fui reencaminhada para um formulário de inscrição para formalizar a reserva. E feito!
Encontram toda a informação no site da Soy Tours, que recomendo mesmo muito!
Preparação e o Que Levar
Preparares-te para a empolgante subida ao vulcão Acatenango é essencial para garantir uma experiência segura e agradável. No entanto, mesmo as pessoas com muita preparação física podem ter dificuldades, e é importante ires mentalizado que pode não dar certo.
Preparação Física
- Antes de embarcares nesta jornada desafiante, é importante estares razoavelmente em forma. A subida envolve caminhadas em terrenos íngremes, rochosos e vertiginosos.
- Antes de ir, fiz muitas vezes passadeira no ginário com inclinação máxima para, achava eu, me preparar. Devo confessar que nada me podia preparar para a exigência física da subida, mas não deixo de achar importante realçar.
Preparação Mental
Podem achar estranho incluir este ponto mas eu achei mesmo fundamental. Tinha falado a imensas pessoas desta minha aventura e queria mesmo ser bem sucedida na mesma. Sempre que fazia passadeira no ginásio fazia-a a ver videos no youtube de pessoas que tinham subido o Acatenango e tenho a certeza que isto serviu para criar em mim alguma preparação mental e determinação para o desafio que me esperava.
No dia anterior à subida, uma amiga disse-me: “A dor é temporária mas a glória é eterna”. Esta frase esteve comigo toda a subida e foi essencial para o sucesso da mesma.
Preparação para a Altitude
- A altitude é um dos maiores inimigos nesta jornada. Os guias normalmente estão preparados para alguma má disposição mas uma das sugestões mais comuns é dormir uma ou duas noites em Antigua (1545 m de altitude) antes de começar esta aventura, para garantir alguma aclimatização.
Vestuário Adequado
- Roupas apropriadas são também cruciais. Leva camadas de roupas para lidar com as mudanças de temperatura à medida que ganhas altitude. Certifica-te de que tens um casaco quente, e roupas à prova de água, especialmente se estiveres a visitar durante a estação chuvosa. Não te esqueças de um gorro, luvas, meias quentes e uma par de calças de flanela, não te vais arrepender durante a noite (eu dormi de quispo e tudo!)
- De realçar que a maioria destes artigos te podem ser emprestados pela agência, mas um quispo teu é sempre algo que deves levar. Tudo o resto acho que fará sentido alugares. Até podes ter sorte como eu e calhar-te um casaco da Calvin Klein!
Calçado Resistente
- Botas ou sapatilhas de caminhada confortáveis e resistentes são essenciais para enfrentar o terreno irregular e rochoso. É importante garantir que os atacadores estão justos ao pé para evitar pés torcidos e outros acidentes.
Bastão de Caminhada
- Podes alugar um bastão de madeira por 5 GTQ na Soy Tours e são mais do que suficiente. Deu-me particular jeito ter só um para me poder agarrar às arvores e pedras com a outra mão. Para quem é mais experiente, poderá fazer sentido alugar dois.
Mochila Adequada
- Opta por uma mochila resistente e confortável, que te permita transportar os itens essenciais sem esforço. Não precisas de uma mochila muito grande mas tem de conseguir carregar 4 litros de água.
- A dica mais importante que posso dar é: escolham uma mochila que tenha suporte nas costas e que aperte na cintura para facilitar o transporte.
- Caso não consigas transportar a tua mochila, podes pagar a um guia para a carregar por ti e custa 200 GTQ (~25€) um sentido apenas (subida, por exemplo). Pessoalmente, carreguei as minhas coisas todas, mas admito que não foi fácil e ter tido alguém a carregar a mochila teria facilitado muito.
Água e Alimentação
- Manter-se hidratado é fundamental durante a subida. A agência recomenda 4 litros de água e eu achei suficiente, não te esqueças que terás de os carregar.
- O resto da alimentação fica ao cargo dos guias, quer a preparação quer o transporte (exceção para o almoço que é stu a carregar). No entanto, recomendo que leves alguns snacks e doces como barras de energia e chocolate para ires petiscando.
Lanterna e Bateria Extra
- Durante a noite no Acatenango, uma lanterna é essencial. Eles recomendam uma lanterna de cabeça e é o ideal. Leva também baterias extra para garantir que a tua lanterna está sempre operacional.
Tenda e Acessórios de Acampamento
- Tenda, saco cama, almofada, colchão, etc estará lá à tua espera e não terás de carregar ou levar nada disto.
Higiene
- Não terás sítio para tomar banho por isso leva apenas e somente o essencial: desodorizante, pasta e escova de dentes e umas toalhitas.
- Leva também medicação que tomes e alguma medicação de prevenção: voltaren, paracetamol, etc. Tenta levar tudo em comprimido para poupar peso.
- Protetor solar é essencial também!
Lembra-te de que a subida ao vulcão Acatenango é uma aventura desafiante, mas incrivelmente gratificante. Estar bem preparado com o equipamento certo e a mentalidade certa tornará esta experiência ainda mais memorável.
A Subida Desafiante
Depois de tudo reservado, chegou o grande dia: 13 de Abril de 2023, o dia da minha subida ao Acatenango. Vou partilhar convosco todo o itinerário.
7h30 | Saída do Hotel
A carrinha da agência passa a recolher todos os que vão fazer a tour por volta desta hora, com descontos sempre para atrasos.
9h00 | Paragem na Sede da Agência
Aqui, explicam-nos todos os procedimentos, emprestam utensílios e roupa, distribuem o almoço e fazemos o pagamento. É também aqui que conhecemos os guias que nos vão acompanhar neste percurso.
Serão 6.5 km até ao local do acampamento que deverão ser feitos em, aproximadamente, 5 horas. O objetivo é fazer paragens a cada meia hora.
09h30 | Começo da Subida
Agora é que vai. Começamos a subir e o guia avisou logo que a parte do início é a mais difícil. Eu não estava pronta. Tinhamos andado pouquíssimo e eu já estava sem ar e a transpirar. O guia aqui perguntou-me: “Estás já cansada, fazes muitas caminhadas?” eu respondi que mais ou menos, mas sabia que a resposta verdadeira era um redondo não. Mas eu não podia dar a parte fraca.
11h00 | Primeira Paragem Oficial
Fizemos a primeira paragem. Tinha comprado 4 garrafas de uma água que se chamava Salva vidas e já estava desesperada para que a água cumprisse o seu propósito.
11h45 | Segunda Paragem Oficial
Fizemos uma segunda paragem mais acima e foi altura de comer um bocadinho de chocolate. Eu já estava cansada e esta era a parte difícil: com escadas e partes só de areia em que os pés se enterravam. Mas nas fotos estamos sempre felizes e contentes.
Algures depois desta paragem passou um senhor a descer que nos disse: “Não vale a pena”. Naquela altura apeteceu-me gritar com ele mas mal tinha energia para subir, quanto mais para me chatear.
12h10 | Chegada à entrada do parque
Eu já estava sem pulmão e só agora chegávamos à entrada do parque. Por outro lado, supostamente a pior parte já tinha passado. Nesta fase tivemos de registar o nosso nome, dados, agência, etc e deram-nos uma pulseira para ficarmos identificados. A parte seguinte do percurso foi por dentro de uma floresta e com sombra, o que ajudou a recuperar algumas forças.
13h15 | Paragem para Almoço
Depois destas horas de subida chegou a altura de almoçarmos. O almoço carregámos nós por isso foi sentar e comer rápido para voltarmos à subida. O almoço era super agradável e completo: frango, arroz, vegetais, sumo, banana e um chocolate. Recomendo apenas que não comam imenso para não ficarem muito cheios, porque a altitude vai começar a fazer efeito e podem ficar mal dispostos.
Não posso deixar de partilhar as coisas que mais gosto de partilhar em viagens: as coisas feias e que ninguém mostra. Neste caso, aproveitei a paragem do almoço para uma ida à casa de banho possível, tendo em conta as condições. No fundo, ainda bem que fui depois de comer!
Continuámos a subida e a certa altura os guias dividiram-se: um foi mais à frente com as pessoas mais ágeis e outro ficou para trás comigo e com mais 4 raparigas que queríamos ir a um ritmo mais lento. Acabou por ser uma ótima decisão.
Um dos guias estava sempre a meter-se comigo a e pedir-me “Ânimo” e eu mal conseguia responder. Perguntou-me se eu tinha namorado e respondi que não. Depois perguntou-me se eu não gostava de namorados e eu respondi: “Os namorados é que não gostam de mim”. Impressionante Carolina, não tens pulmão para subir isto mas para mandar piadinhas… enfim!
Fomos fazendo algumas paragens, para respirar ou para prestar auxílio umas às outras. Houve uma rapariga que vomitou, outra que precisou da bomba de asma e uma outra que tinha medo de alturas e teve alguma dificuldade em troços mais vertiginosos. Todas nos ajudámos e puxámos umas pelas outras e isso foi mesmo bonito.
A altitude não é brincadeira e o teu corpo já não responde tão prontamente às tuas ordens. Cada passo é um grande esforço.
A certa altura começamos a ver o cume do vulcão e mais à frente avistamos o Vulcão de Fogo e sabíamos que íamos conseguir. Eu já estava com um espírito inabalável. É nesta altura que o teu corpo aproveita a felicidade e a usa como combustível para um último esforço que já quase não custa.
16h30 | Chegada ao Acampamento
O Campo Base e um Pôr-do-sol Inesquecível
Chegada ao Campo Base da Soy Tours, foi altura de fazer uma tour e perceber como funciona toda a logística. O Acampamento fica a 3756m e está devidamente equipado para nos auxiliar numa noite.
Tendas e camas
Dentro de uma grande tenda/cabine tínhamos as nossas tendas montadas. Ficámos juntos 2 a 2 ou em grupos de 3 pessoas. Caso não vás em grupo, eles próprios fazem as alocações. Dentro das tendas há colchões, sacos cama e almofadas para cada um, tudo já preparado, é só deitar.
Casa de Banho
Mais uma vez, das minhas coisas favoritas de partilhar. Esta casa de banho requeria quase uma escalada. Tinhas de subir umas pedras para lá chegar e era no mínimo engraçada. De dia, utilizei esta, de noite, a casa de banho foi uma árvore mais próxima cuja ida requeria menos esforço físico.
Foi também entre a chegada e o jantar que algumas pessoas fizeram a caminhada extra até ao Vulcão de Fogo. Eu optei por não fazer, até porque estava exausta e na verdade também tinha algum receio de chegar mais próximo do vulcão. Voltaram algum tempo depois e confessaram que não viram grande coisa porque começou a ficar escuro e estava muito nevoeiro aquela altitude.
Enquanto isso, aos restantes deram um licor da Guatemala (Quezalteca) e umas batatas fritas e ficamos a apreciar a paisagem. Atentem para o surro nas mãos de todo o pó da subida. Pormenores que eu adoro, reais.
Os guias apressaram-se a começar a organizar o jantar enquanto ainda era de dia.
Durante este tempo, tivemos a oportunidade de apreciar um dos mais bonitos pores do sol que já tive a oportunidade de presenciar. Estávamos acima das nuvens, com vista para o Vulcão de Fogo em erupção e o sol dourado brilhava por cima das nuvens. É uma sensação bonita esta de sentir que tudo está certo, que estás onde devias estar e que a vida é isto. E consegues sentir tudo isto apenas com um simples pôr-do-sol. Quem disse que a vida era sobre coisas complexas? Sempre foi sobre coisas simples.
Uma Noite Sob as Estrelas
19h30 | Jantar
Terminada a preparação do jantar, estava na altura de aproveitarmos esta refeição: noodles com legumes, puré de batata, puré de feijão e umas bolachas de milho fritas. Tivemos ainda direito a marshmallows.
O jantar foi apreciado à volta da fogueira, juntamente com variadas conversas, nomeadamente sobre o passado colonial da maioria dos países Europeus.
Depois, foi hora de apreciar a paisagem. As estrelas muito brilhantes num cenário sem luz artificial, a lava a escorrer pelo vulcão… Foram momentos bonitos, embrulhados na nossa roupa toda e com frio, sentimos o calor que aquela noite tinha para nos oferecer. E será algo que nunca esquecerei, mesmo que as fotografias nunca façam jus à beleza que os olhos presenciaram.
Tivemos liberdade para nos deitarmos às horas que quisemos e fomos, um a um, indo para as tendas descansar. Estava bastante frio, por isso vesti toda a roupa que tinha, quispo sobre quispo e enfiei-me dentro do saco cama. Nessa noite sonhei que o vulcão tinha entrado em erupção e lava tinha entrado pelo nosso acampamento adentro. Faz parte da ansiedade de viajar.
A Conquista do Cume do Acatenango
4h00 | O despertar
Vieram acordar-nos por volta das 04h. Estava na hora da grande subida ao cume do Vulcão Acatenango. Vestimos toda a nossa roupa (eu na verdade tinha dormido com toda a roupa), calçámo-nos, pusemos as lanternas na cabeça e aí fomos nós, montanha acima, em fila indiana.
O grupo foi subindo e estavamos mais ou menos separados de novo entre o grupo dos que iam mais rápido e eu e outra rapariga que acabámos por ficar para trás. Nunca pensei que fosse tão difícil. A altitude começa mesmo a apoderar-se do nosso corpo. Cada passo custa mesmo muito.
É nestes momentos que percebemos que não controlamos o mais básico da vida: nós próprios. Não controlei a respiração ofegante, o coração a palpitar, as dores de cabeça e a corrente que me puxava para baixo. Mas aprendi que há uma coisa que está sempre ao nosso alcance de controlar: a nossa força de vontade, a nossa forma de ver as coisas. Nestes últimos metros, quando o sol já tinha nascido, já estava o grupo todo no topo e eu sabia que ia ter de descer breve, tive a oportunidade de controlar a mente. Eu tinha de ir subir tudo. Pé ante pé, fui subindo a sonhar com a sensação de chegada.
Esta é das poucas fotos que tenho, já tinha nascido o sol e estavamos mesmo quase no topo.
Apesar de me sentir derrotadíssima, a natureza foi-nos brindando com erupções do Vulcão de Fogo, como que a incentivar-nos para subir e chegar ao nosso destino. O barulho, a lava, o brilho do sol a nascer, que paisagens inacreditáveis.
5h55h | Chegada ao cume do Vulcão Acatenango, 3976m
E, quando finalmente chegámos, sentámo-nos, abraçámo-nos e chorámos. Tínhamos conseguido. Nem toda a gente tinha acordado às 4h para tentar o cume, nem toda a gente tinha conseguido e alguns nem tentado. Mas nós estávamos ali, porque ficámos as duas para trás a apoiar-nos uma à outra. E conseguimos!
Cheguei. Chorei. Abracei.
E 5 min depois o guia pedia para descer. Já pensei várias vezes que se tivesse dado ouvidos à força que me puxava para baixo, não teria tido tempo de chegar ao cume. E tenho a certeza que não esquecerei aqueles 5 min lá em cima. A vida é cheia de vozes que nos puxam para baixo, de dores de cabeça e de palpitações. Temos de ser nós a voz que queremos ouvir. Não há mais ninguém a puxar por nós, não há mais ninguém a levar-nos ao colo. Temos de ser nós. E, quando o fazemos, somos invencíveis.
A Descida Infinita
5 min depois de ter alcançado o cume do Acatenango, pediam-nos para descer. E assim foi, filinha indiana, uns atrás dos outros, fizemos o caminho de volta até ao acampamento, onde nos esperava um pequeno almoço dos deuses: panquecas, mel, ovo cozido, banana, bolachas e chá ou café.
Depois, foi hora de arrumar as coisa e voltar a descer. O guia que nos acompanhou na subida perguntou se queríamos sair mais cedo para fazer a descida com mais calma. A minha resposta foi um claro sim e gostei muito da atenção.
A maioria das pessoas desce a correr e , como ainda não estava muito familiarizada com a técnica, tinha medo de cair por isso fomos começando a descer com calma. No fim da descida já consegui fazer alguns trechos a correr e reconheço que é muito mais fácil e põe muito menos pressão nos joelhos. Com o tempo vamos aprendendo esta arte de subir e descer vulcões.
A meio do caminho as pernas pareciam gelatina e parecia que o caminho nunca mais acabava. As minha mãos estavam inchadas e sujíssimas. Já só queria acabar. E nem parei para descansar porque acho que se tivesse parado as minhas pernas não tinham conseguido retomar.
10h33 | O fim do percurso
Mas, algumas horas depois vemos finalmente a saída. É uma sensção de alívio enorme.
11h | Uma coronita como prémio
Fomos chegando à sede da agência e fomos despindo a roupa quente, procurando descanso numa cadeira, alguns até lavando os pés e mudando para chinelos. Eu, fiel a mim mesma, apreciei a cerveja que me ofereceram e saboreei o momento, o sentimento de dever cumprido, a concretização pessoal.
Reflexões Finais
A viagem à Guatemala não estava nos meus planos. Surgiu depois da necessidade de cancelar uma viagem ao Peru pela instabilidade política do país. Comecei a pesquisar um outro país que me pudesse acalmar o bichinho carpinteiro e encontrei a Guatemala.
Pesquisei muito e quando vi que havia a possibilidade de subir um vulcão e ver outro em erupção, fiquei doida. Queria fazer aquilo. Desde a compra da viagem que comecei a ir ao ginásio e a tentar ser mais ativa, achando eu, para me preparar. Estava enganada.
Nada me podia preparar para o que ia enfrentar. O meu corpo não estava pronto. Mas fez toda a diferença. As horas na passadeira a ver vídeos de pessoas a subir o vulcão formaram em mim uma força psicológica que desconhecia. Eu não sabia que a minha mente era tão poderosa. Eu não sabia que o meu corpo ia estar a pedir ajuda aos berros e que eu ia conseguir acalmá-lo com o poder da mente. É mesmo um daqueles momentos em que a tua mente e o teu corpo estão em luta para ver quem é mais teimoso. Eu não sabia que conseguia ser tão motivadora e positiva (para quem me conhece bem, acreditem que quase não me queixei. Bem sei que é difícil acreditar).
Eu não sabia que ia conseguir, mas eu sabia que queria muito e que tinha de o fazer. Por todas as pessoas a quem tinha falado desta aventura. Mas, principalmente, por mim. Eu precisava de me provar que eu consigo tudo aquilo a que me propuser. Que eu consigo ultrapassar as dores, o negativismo e todos os obstáculos.
Não sei se este feito mudou a minha vida. Eu acho que ela já tinha mudado quando eu decidi que ia fazer isto. As vidas não mudam quando chegamos ao destino. As vidas mudam quando decidimos onde queremos chegar.
